Como Berlim, enviado de Trump sugere divisão da Ucrânia para alcançar paz

Em entrevista ao jornal britânico “The Times”, Kellogg propôs estabelecer no oeste da Ucrânia uma “força de segurança” liderada pelo Reino Unido e pela França e concentrar as tropas ucranianas a leste do rio Dnipro, servindo este como linha de separação entre as duas zonas.

Os territórios ucranianos atualmente sob ocupação seriam controlados pelas forças russas

“Quase poderia fazer-se algo parecido com o que aconteceu a Berlim depois da Segunda Guerra Mundial, quando havia uma zona russa, uma zona francesa, uma zona britânica e uma zona americana”, disse.

Embora o Kremlin tenha rejeitado repetidamente a ideia de as tropas europeias monitorizarem um cessar-fogo na Ucrânia, Kellogg disse que uma força liderada pelo Reino Unido e pela França no oeste da Ucrânia “não seria nada provocatória” para a Rússia.

“Estaria a oeste [do Dnipro], o que é um grande obstáculo”, disse o general norte-americano, que apesar de ser enviado para a Ucrânia tem sido secundarizado no papel em relação a Steve Witkoff, que é o emissário do presidente Donald Trump para o Médio Oriente.

Kellogg propôs ainda a criação de uma zona desmilitarizada de 29 quilómetros no leste da Ucrânia, ao longo da atual linha da frente, para servir de barreira entre as tropas russas e ocidentais.

“Olha-se para um mapa e cria-se, à falta de melhor termo, uma zona desmilitarizada [DMZ]. Levem-se ambos os lados 15 quilómetros para trás”, disse Kellogg. “E teríamos uma DMZ que pode ser monitorizada, e esta (…) zona de cessar-fogo pode ser monitorizada com bastante facilidade”, adiantou.

O general norte-americano admitiu que a Rússia pode não aceitar a proposta e que as condições do cessar-fogo poderão ser violadas.

“Agora, haverá violações? Provavelmente, porque há sempre. Mas a nossa capacidade de monitorizar isso é fácil”, disse.

Kellogg disse ainda que Washington não enviaria quaisquer tropas terrestres para a força de segurança na Ucrânia.

E alertou a França e o Reino Unido para não contarem com o apoio norte-americano à aliança de países europeus e da Commonwealth que se comprometeram a fornecer garantias de segurança à Ucrânia após um cessar-fogo.

“Planeiem sempre para o pior cenário”, aconselhou.

Kellogg acrescentou ainda que a força de segurança da coligação seria capaz de enviar uma mensagem eficaz ao presidente russo, Vladimir Putin.

Os comentários de Kellogg marcam a primeira vez que uma alta autoridade norte-americana propõe o Dnipro como uma linha de demarcação na Ucrânia no pós-guerra.

A proposta surge no mesmo dia em que o enviado especial de Trump para o Médio Oriente, Steve Witkoff, se encontrou em São Petersburgo com o presidente russo, Vladimir Putin, para discutir um futuro acordo de paz na Ucrânia.

O plano de Kellogg para dividir a Ucrânia, no entanto, implicaria deixar sob controlo russo as regiões ocupadas ilegalmente, e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, já afirmou que o seu país nunca reconhecerá estes territórios como legalmente russos.

Trump manifestou hoje frustração com a falta de progressos entre a Ucrânia e a Rússia, através da porta-voz da Casa Branca. “O presidente [Trump] foi muito claro ao expressar a contínua frustração com ambos os lados deste conflito e quer ver o fim da guerra”, declarou a porta-voz à imprensa na Casa Branca.

No entanto, a porta-voz indicou que os Estados Unidos mantêm influência suficiente para negociar um acordo de paz e Trump está determinado a avançar.

O político republicano, que no regresso à Casa Branca em janeiro defendeu uma aproximação ao Kremlin e teceu duras críticas ao homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, manifestou recentemente insatisfação com os contínuos bombardeamentos russos na Ucrânia e falta de compromisso de Moscovo com uma trégua.

A Rússia invadiu a Ucrânia a 24 de fevereiro de 2022, com o argumento de proteger as minorias separatistas pró-russas no leste e “desnazificar” o país vizinho, independente desde 1991 – após a desagregação da antiga União Soviética – e que tem vindo a afastar-se do espaço de influência de Moscovo e a aproximar-se da Europa e do Ocidente.